Um morador de Três Coroas vai pedalar cerca de 230 quilômetros em homenagem ao filho que teria completado 18 anos no último dia 26 de fevereiro. Essa é a realização de uma promessa que o coordenador de produção de uma empresa do ramo têxtil Márcio Fernando Hedler, de 39 anos, fez ao seu primogênito, Guilherme Fernando Hedler, o Gui. O menino faleceu aos 13 anos, em 2019, vítima de um tipo raro de leucemia.
O Pedal do Gui será realizado neste sábado (9). Márcio contará com o apoio dos amigos do grupo de ciclismo do qual entrou após perder o filho. A saída será às 4 horas, em frente à prefeitura de Três Coroas. O destino é o Hospital da Criança Santo Antônio, em Porto Alegre, onde o menino ficou internado e realizou o tratamento contra a doença.
“No hospital, vamos soltar balões brancos com sementes de girassol, que era a flor favorita dele. Depois, também iremos até a Orla do Guaíba, que era um dos poucos locais que ele podia frequentar para evitar qualquer infecção, já que é ao ar livre. Após, na volta, vamos parar na Arena do Grêmio para fazer fotos. Ele era um gremistão”, conta o pai sobre o trajeto. A previsão de retorno é às 18 horas. Os cerca de 230 quilômetros totalizam a ida e a volta ao Vale do Paranhana.
Interessados em participar do Pedal do Gui podem se juntar ao grupo no local de partida ou pelo trajeto a combinar, o que pode ser feito pelos contatos (51) 99913-9573 ou (51) 99885-6118. Além disso, o grupo está arrecadando produtos de limpeza e higiene que serão destinados ao Instituto Santíssima Trindade, casa de acolhimento de crianças e adolescentes. Quem desejar pode fazer doação em dinheiro através do Pix da instituição: CNPJ 92.849.850/0001-87.
“Só não sai se realmente estiver chovendo muito forte às 4 horas, na saída. Mas para a gente que está pedalando, uma chuva no caminho não é nada mal”, afirma Márcio.
No domingo (10), o grupo fará outra ação. Dessa vez, irá pedalar da prefeitura de Três Coroas até o Instituto Santíssima Trindade, no bairro Moreira, na zona rural do município, para entregar as doações arrecadadas. A saída será às 9 horas.
A luta de Gui e a promessa de pedalarem juntos
Guilherme foi diagnosticado com câncer aos 11 anos. O pai do jovem lembra que foi em maio de 2017 que o menino começou com algumas infecções. A família o levou em diferentes médicos e nenhum conseguia afirmar o que ele tinha. “Chegaram a tratar ele para Gripe A, sendo que ele não tinha nenhum sintoma da doença. Mas naquele momento nós também não sabíamos”, conta.
Após muitas idas e vindas em médicos, em agosto daquele ano, o menino foi levado para o Hospital da Criança Santo Antônio, em Porto Alegre. “Chegando lá, depois da meia-noite, já era Dia dos Pais. Nós recebemos a notícia da leucemia do Guilherme. Já estava 99,5% do corpo dele tomado.”
A irmã caçula, na época com 4 anos, foi a doadora de medula óssea. “A gente achou que estava tudo certo, ela era compatível. Só que a gente precisava brigar com a doença para zerar a medula e fazer o transplante. Várias vezes os médicos nos chamavam no hospital para ficar lá, esperando o pior”, lembra. “A gente tinha que voltar para o quarto, engolir o choro e falar que tá tudo bem. A gente lutou, os médicos achavam que ele não chegaria ao transplante. Ele chegou no transplante!”, acrescenta.
Coincidentemente, um ano depois do diagnóstico, no dia dos Pais de 2018, Guilherme e a irmã internaram no hospital para fazer o procedimento. A medula da menina foi coletada na segunda-feira e o transplante realizado na quarta-feira, 14 de agosto.
Durante o período de recuperação, a esperança era o que movia pai e filho. “Em setembro, fizemos esse combinado, que nós iríamos até Porto Alegre pedalando quando ele completasse 18 anos para comemorar isso”, conta o pai. “A gente falou e nem se deu conta, a gente pedalava, mas só aqui em Três Coroas, dentro da cidade. A gente fazia uns ‘quilometrozinhos’, a gente estava sempre andando de bicicleta. Mas a gente fez esse combinado”, completa.
O luto e a volta por cima com o ciclismo
Márcio conta que a família precisou alugar um apartamento na capital, pois, após o transplante, Gui precisava ficar de três a quatro meses próximo à casa de saúde onde realizou o procedimento. Apenas em dezembro de 2018 ele pôde voltar para a casa da família, em Três Coroas.
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“Ele gostava muito de ajudar o próximo. Dentro disso, a gente fez uma campanha para o Instituto Santíssima Trindade. E, coincidentemente, nesse pedal, estamos fazendo essa campanha para ajudar eles, pois a esposa de um amigo meu trabalhou lá e levantou essa questão. Então, pra mim, foi algo muito forte, pois lá atrás foi feito para o mesmo instituto, e agora de novo”, conta Márcio sobre o que filho quis fazer quando deixou o hospital após o transplante.
Em janeiro de 2019, a família recebeu a notícia de que a doença havia voltado. “Falaram que em 15 dias o Guilherme estaria partindo daqui. Mas ele foi muito guerreiro, viveu por mais 4 meses e com uma alegria intensa. Ele, sabendo do que estava para acontecer, fingia que nada estava acontecendo para poupar a gente”, conta. “Era um menino de ouro”, acrescenta. No dia 24 de maio daquele ano, Guilherme faleceu.
Márcio relata que, após a morte do filho, entrou em depressão. Após mais de um ano, ainda não estava socializando e saía o mínimo possível de casa, até que uma publicação em rede social fez com que ele lembrasse da promessa de pedalar com Gui. “Vi um pessoal pedalando, amigos meus. Um grupo, Iludidos MTB, e me veio a lembrança. Pensei ‘vou falar com essas pessoas, vou ver se começo a pedalar para ver se eu consigo cumprir essa promessa’”, recorda.
Depois disso, o pai de Guilherme entrou no grupo de ciclismo e passou a se preparar para realizar a promessa. Nesse período, ele conta que os amigos que ele fez no grupo deram muito força, especialmente após saberem do seu propósito. “Fui pedalando, gostando e me apaixonado por esse esporte”, afirma.
“A bicicleta me tirou da depressão. Hoje, ela me coloca para fazer esse combinado com o Gui”, salienta Márcio. “Não sei como vai ser, porque às vezes que tive que ir a Porto Alegre, eu desviei desses caminhos. Vai ser a primeira vez que vou voltar ali. Vai ser uma coisa que a emoção vai tomar, mas é preciso fazer”, finaliza.