PRAZO AMPLIADO

Lei Kiss tem mais um adiamento de prazo

Sancionada em 2013, legislação que busca melhorar a prevenção de incêndios acumula prorrogações em 10 anos

Publicado em: 09/01/2024 11:03
Última atualização: 09/01/2024 11:03

Na esteira da tragédia da boate Kiss em 2013, a Assembleia Legislativa (AL/RS) e o governo estadual da época agiram rápido e naquele mesmo ano aprovaram e sancionaram uma lei que tornava mais rígida a fiscalização para prevenção de incêndios no Estado.

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Prazo para que prédios façam adaptação do seu PPCI foi ampliado para o final de 2024 Foto: CBMRS

Passados mais de 10 anos do incêndio que deixou 242 pessoas mortas e da promulgação da lei, houve diversos avanços, contudo há também a marca de adiamentos e protelações para colocar em prática o que diz o texto.

O mais recente adiamento foi definido no final de dezembro, quando o governo do Estado editou um decreto protelando até o final de 2024 o prazo de adequação das edificações e áreas de risco de incêndio se adequarem ao Plano de Prevenção Contra Incêndios (PPCI).

Chefe da Seção de Segurança Contra Incêndios do 2º Batalhão de Bombeiro Militar, o capitão Tiarles Gularte de Almeida diz que a decisão foi tomada levando em conta a situação causada pelos eventos climáticos de 2023. “A prorrogação ocorreu para atender diferentes segmentos, uma vez que efeitos climáticos extremos impactaram neste ano (2023) o Estado, que ainda sentia efeitos da pandemia”, explica.

Pressões por mudanças

Mas essa não foi a primeira alteração feita na chamada Lei Kiss nessa mais de uma década de existência. Já em 2016 veio a primeira ampliação de prazos, no caso a respeito do Alvará de Prevenção e Proteção Contra Incêndio (APPCI).


Em 2023 a tragédia que tirou a vida de 242 pessoas completou 10 anos Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Desta vez a mudança é na implementação de Medidas de Segurança Contra Incêndios (MSCI), exigidas de acordo com as características de cada imóvel. “As MSCI são definidas pelos critérios: altura; área total construída; ocupação e uso; capacidade de lotação; grau de risco de incêndio”, explica o capitão Gularte.

Professora de engenharia civil e coordenadora do curso de especialização em engenharia de segurança contra incêndio da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Ângela Graeff, aponta que as sucessivas prorrogações acabam por fragilizar a situação dos frequentadores destes espaços. “Certamente, quando a gente adia prazos, a gente está dizendo que a gente pode deixar para depois”, diz.

Apesar de reconhecer as dificuldades provocadas pela pandemia do Covid-19 e também pelas condições climáticas de 2023, a especialista critica as sucessivas alterações e adiamentos na implementação da lei em sua totalidade. “Não vejo nenhuma questão positiva (nos adiamentos), entendo que teve alegações do ponto de vista das enchentes, as questões climáticas que atacaram o Estado, a gente está vindo ainda de uma pandemia. Mas eu pensando no usuário final, o usuário que usa as edificações, que precisa estar seguro”, aponta Ângela.

Mudança de Cultura

Essa demora na implementação é, na avaliação de Ângela, não é motivada apenas pela pressão de alguns setores ou letargia do poder público. A questão cultural é apontada por ela como fator determinante no caso. “Temos uma barreira cultural muito forte, onde a gente normalmente entende que as instalações de prevenção e proteção contra incêndio são, muitas vezes, um gasto desnecessário porque parece que nunca vai acontecer”, aponta.

Junto a isso, Ângela considera que o poder público, como um todo, tem que dar o exemplo quando o tema é prevenção. “Tem um ponto muito importante na questão dos agentes públicos. Se a gente for pensar, a lei vale para todos, não só para as instituições privadas, e temos uma dificuldade orçamentária muito forte nas instituições públicas que não conseguem adaptar os seus prédios.”

Com esse cenário, Ângela olha com ceticismo para a possibilidade de implementação completa da lei no Estado. “Não consigo imaginar que tão logo ela consiga se estabelecer, a não ser que a gente tenha realmente essa imposição de alguma forma”, aponta ela que ainda ressalta a necessidade de se trabalhar em ações educativas junto

Evolução

Vendo o cenário completo, contudo, a Lei Kiss conseguiu sim trazer mudanças positivas no tema do cuidado para evitar incêndios, a começar pela região dos Vales do Sinos, Paranhana e Caí. “De maneira geral é possível verificar que os empresários da região têm buscado se adequar às normas vigentes de segurança contra incêndio”, afirma o capitão Gularte.

Mesmo a professora da UFRGS aponta uma evolução, ainda lenta, nas ações governamentais. “A gente vê uma atuação muito forte do Corpo de Bombeiros, seja na melhoria dos procedimentos de avaliação dos projetos de prevenção e proteção contra incêndio”, avalia ela, que também percebe uma melhora na conscientização da sociedade.

“Ministro de uma disciplina de segurança contra incêndio, que antes não existia, e que ainda continua sendo ministrada. E cada vez mais a gente está plantando mais programas dentro da universidade. Eu atuo diretamente com vários profissionais, atuo diretamente com empresas que trabalham na área da prevenção e da proteção contra incêndio, então eu vejo empresas muito capacitadas, eu vejo profissionais muito interessados, eu vejo uma mudança.”

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